Tem algo desconcertante acontecendo no mundo corporativo. Estamos cercados por dados, munidos de inteligência artificial, sufocados por dashboards em tempo real. As respostas estão por todos os lados. Mas as decisões continuam rasas, a inovação estagnada e os times desengajados. O que está faltando? A pergunta certa.
Mesmo com o uso crescente da inteligência artificial, a incapacidade de fazer boas perguntas se tornou um novo tipo de analfabetismo corporativo. Afinal, se você não sabe perguntar, está limitado ao que já sabe ou ao que te impõem e isso é um problema, por vezes, silencioso e mais grave do que parece.
Há uma ansiedade generalizada no ar. Um culto à velocidade. Em nome do ROI, da entrega, da agilidade, perguntas foram silenciadas e diagnósticos ignorados. Hoje, tudo precisa funcionar "pra ontem". E, nesse ritmo, empresas estão confundindo produtividade com profundidade e trocando estratégia por improviso disfarçado de eficiência.
Isso porque a cultura da resposta rápida elimina o tempo necessário para refletir. Mas sem esse tempo, não existe inovação sustentável. Claro, os dados estão aí. Relatórios automatizados, painéis coloridos, fluxos bem organizados. Entretanto, aqui vai uma verdade desconfortável: dados sem perguntas certas viram apenas ruído elegante.
Dashboards são apenas formas de organizar números. O que importa é saber lê-los e, principalmente, saber o que você está buscando. Se você só usa os dados para confirmar o que já sabia, você não está analisando, está somente validando seu próprio viés.
Na IA generativa, as respostas estão a um clique. Mas isso é uma ilusão perigosa, uma vez que ela só entrega o que você pede. E se você não souber perguntar, interpretar e avaliar a resposta, pode estar sendo enganado pela sedução da resposta fácil.
Hoje, a real vantagem competitiva não está em usar IA. Está em saber conduzi-la com perguntas potentes, profundas e estratégicas. Quem não fizer isso, será substituído, não somente pela máquina, mas por alguém que soube pensar melhor com ela.
Em paralelo, uma ameaça silenciosa cresce nas empresas: o medo de perguntar. Ambientes onde questionar é visto como fraqueza ou insubordinação tornam-se zonas seguras para o status quo e verdadeiros cemitérios para a inovação.
Vejam, a cultura de inovação não depende de um novo app, e sim de um ambiente seguro onde perguntar é sinal de inteligência e não de ameaça. Se a liderança é insegura, ela reprime o questionamento para manter controle. E isso cria times homogêneos, sem contraponto, onde a criatividade morre e ninguém ousa discordar.
Quando isso acontece, não apenas ideias novas deixam de surgir. O pensamento crítico é enfraquecido e o senso de pertencimento desaparece. Quando a pergunta nasce corretamente, a resposta vem com mais força. Ela deixa de ser uma fórmula genérica e se transforma em um ponto de vista mais certeiro. Basta refletir: de que adianta uma pergunta bem feita se os dados estão desorganizados? E como organizar os dados se você não sabe para que quer usá-los? Tudo é cíclico. As empresas precisam de tempo para parar, refletir, arrumar a casa. Sem isso, o movimento não se retroalimenta.
Além disso, se antes perguntar era sinal de inteligência, agora é simplesmente um critério de sobrevivência digital. A IA só devolve com qualidade se você souber direcionar com profundidade. O problema é que muita gente está sendo seduzida pela resposta fácil sem saber interpretar ou avaliar o que está lendo
Sim, estamos numa corrida por respostas. Porém, a inovação nasce do desconforto e ele começa com uma pergunta incômoda. Mas para que esse ciclo funcione, é preciso dar tempo. Tempo para ouvir, refletir e organizar dados com propósito.
É preciso saber o que perguntar e a pergunta certa depende da pausa certa. E o que fica pra nós de certeza (se é que podemos ter alguma) é que não existe inovação sem respiro.
Respiremos!
Cristovão Wanderley, CTO e sócio-diretor da Stratlab.