Obrigatoriedade de seguro deve transformar o mercado de cybersegurança no Brasil

há 3 dias 9

A crescente digitalização da economia brasileira e os avanços tecnológicos em setores críticos, como o financeiro, têm colocado a cibersegurança no centro das estratégias corporativas. Recentemente, o Banco Central aprovou uma resolução que torna obrigatória a contratação de seguros cibernéticos para fornecedores de tecnologia que atuam no sistema financeiro, medida vista como um marco regulatório que pode redesenhar o mercado.

Para analisar esse cenário, conversamos com Marta Helena Schuh, Diretora de Seguros Cibernéticos e Tecnológicos na Howden Brasil, professora de segurança cibernética e gestão de riscos, além de Diretora do Departamento de Defesa e Segurança (DESEG) da FIESP. Com mais de 15 anos de experiência no setor financeiro e de seguros, Marta também é reconhecida internacionalmente como uma das principais vozes femininas em cibersegurança, tendo sido destaque pela WOMCY, organização que fomenta a formação e liderança na área em toda a América Latina.

Segundo ela, a exigência do Banco Central é um divisor de águas. "Estamos diante de um momento histórico. Assim como no passado a tecnologia transformou os processos de seguros tradicionais — como quando bastava fotografar um carro para dispensar uma inspeção presencial — agora vivemos uma era em que o risco digital passa a ser tratado como parte essencial da solidez do sistema financeiro", afirma.

Para Marta, a obrigatoriedade de seguros cibernéticos traz desafios imediatos. "O mercado brasileiro ainda está amadurecendo nessa frente. Muitas empresas sequer mensuram corretamente seus riscos digitais, e agora terão que estruturar políticas de compliance e contratação de apólices adequadas. Isso exige não só produtos bem estruturados pelas seguradoras, mas também um trabalho consultivo muito forte por parte das corretoras", explica.

A Howden, corretora multinacional presente em 56 países, tem acompanhado de perto essa transformação. No Brasil, atua em parceria com as principais seguradoras, oferecendo desde soluções para grandes corporações até programas para pequenas e médias empresas. "Nosso papel é traduzir a complexidade do risco cibernético em soluções acessíveis, garantindo que as empresas possam se proteger diante de ataques cada vez mais sofisticados", completa.

Profissionais e cultura de risco

Um dos pontos levantados por Marta é o comportamento dos profissionais diante da cibersegurança. "Ainda existe a percepção de que a responsabilidade é apenas da área de TI. Mas o risco é transversal: envolve jurídico, compliance, RH, comunicação e principalmente a alta liderança. O fator humano segue sendo a maior vulnerabilidade, seja por falta de treinamento ou por falhas operacionais", ressalta.

Ela destaca que a educação corporativa precisa ser contínua. "Não adianta implementar tecnologias avançadas se os profissionais não compreendem a importância da segurança digital. As empresas que prosperam nesse campo são aquelas que criam uma cultura organizacional voltada para a gestão de riscos".

Inteligência artificial e novos desafios

A executiva também chama atenção para a chegada da inteligência artificial generativa e agentes autônomos de IA, que ampliam tanto as oportunidades como as ameaças. "A IA pode acelerar processos de atendimento, análise de sinistros e mitigação de riscos, mas também aumenta a superfície de ataque. Hackers já estão explorando essas tecnologias, e o setor precisa correr para se antecipar".

Nesse sentido, Marta enfatiza que os princípios de governança digital são indispensáveis. "Na Europa, o AI Act já cria diretrizes claras sobre o uso de inteligência artificial. No Brasil, ainda estamos construindo essa regulamentação, mas as empresas responsáveis já adotam protocolos de transparência, imparcialidade e privacidade para mitigar vieses e proteger dados sensíveis".

Perspectivas para o mercado de seguros cibernéticos

O mercado de seguros cibernéticos global já movimenta bilhões de dólares e deve crescer de forma acelerada nos próximos anos, acompanhando a escalada de ataques. No Brasil, Marta vê espaço para um salto significativo: "A obrigatoriedade do Banco Central vai estimular a procura e gerar escala. Isso, por sua vez, permitirá a criação de produtos mais acessíveis e especializados, atendendo desde fintechs até grandes bancos. É um ciclo virtuoso, mas que depende de maturidade das empresas e de uma rede sólida entre reguladores, seguradoras e corretores".

Para a especialista, a principal lição que as empresas precisam absorver é que a cibersegurança não é um projeto com início e fim, mas um processo contínuo. "Ataques mudam todos os dias. A melhor defesa é investir em prevenção, monitoramento e resposta rápida. O seguro cibernético é parte dessa equação, não substitui a proteção técnica, mas garante resiliência financeira quando o pior acontece", conclui.

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