O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) defendeu nesta terça-feira, 23 de setembro, durante discurso de abertura da 80ª Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), em Nova York, a regulação das plataformas digitais (conhecidas por Big Techs) como instrumento de proteção social e de preservação da soberania dos Estados. Pelo protocolo adotado desde 1955, o Brasil é sempre o primeiro país a discursar na assembleia, que reúne 193 chefes de Estado e de governo.

“A internet não pode ser uma ‘terra sem lei’. Cabe ao poder público proteger os mais vulneráveis. Regular não é restringir a liberdade de expressão. É garantir que o que já é ilegal no mundo real seja tratado assim no ambiente virtual”, afirmou o presidente. Ele advertiu que ataques à regulação “servem para encobrir interesses escusos e dar guarida a crimes, como fraudes, tráfico de pessoas, pedofilia e investidas contra a democracia”.
Contexto brasileiro e o PL das Big Techs
O pronunciamento ocorre na mesma semana em que o governo federal enviou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 4.675/2025, conhecido como “PL das Big Techs”. A proposta foi elaborada pela Secretaria de Reformas Econômicas do Ministério da Fazenda, em conjunto com a Casa Civil, após dois anos de estudos e consultas públicas.
O texto cria mecanismos para que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) designe “plataformas de relevância sistêmica” no mercado digital, sujeitas a obrigações específicas. O enquadramento dependerá de critérios qualitativos, como posição estratégica, número de usuários e acesso a dados, além de um piso de faturamento — R$ 5 bilhões no Brasil e R$ 50 bilhões globais.
As empresas designadas poderão ser obrigadas a adotar medidas como permitir portabilidade de dados, não favorecer produtos próprios em buscas, viabilizar integração de aplicativos concorrentes e notificar aquisições de startups. Para monitorar e aplicar essas regras, será criada a Superintendência de Mercados Digitais (SMD) no Cade.
Inteligência artificial e Sul Global
Ainda em seu discurso, Lula advertiu para os riscos da concentração da inteligência artificial em poucos países e corporações. “Vivenciamos a consolidação de assimetrias que levam a um verdadeiro oligopólio do saber. Interessa-nos uma inteligência artificial emancipadora, que também tenha a cara do Sul Global e que fortaleça a diversidade cultural”, disse.
O presidente defendeu a criação de uma governança internacional para a tecnologia, de caráter intergovernamental, e sublinhou que a IA deve respeitar direitos humanos, proteger dados pessoais e ser instrumento de paz.
Com a intervenção, o Brasil buscou alinhar o debate global na ONU às iniciativas nacionais em curso, reforçando a proposta de regulação econômica das plataformas digitais e destacando o papel do país na construção de um arcabouço multilateral para a governança da internet e da inteligência artificial.