O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou nesta quarta-feira, 17, medida provisória (MP) que cria o Regime Especial de Tributação para Serviços de Datacenter no Brasil, ou Redata. O texto deve ser publicado oficialmente nesta próxima quinta-feira, 18.
Os incentivos previstos na MP garantem isenção de PIS/Pasep, Cofins e IPI na aquisição de equipamentos de TIC, importados ou produzidos no Brasil, destinados à implantação, ampliação e manutenção de data centers. Equipamentos sem produção nacional similar ficam isentos também de imposto de importação.
Em contrapartida aos incentivos do Redata, as empresas terão de aportar 2% do valor dos produtos adquiridos com o benefício em investimentos em projetos de pesquisa, desenvolvimento e inovação. O recurso será aplicado em programas prioritários de apoio ao desenvolvimento e adensamento industrial da cadeia produtiva de economia digital.
As empresas beneficiadas pelo Redata também terão que oferecer ao mercado nacional no mínimo 10% da capacidade de processamento, armazenagem e tratamento de dados. No caso de empreendimentos para as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, a política prevê a redução de 20% dessas duas obrigatoriedades.
Outra contrapartida essencial será o cumprimento de critérios de sustentabilidade, como uso de energia renovável ou limpa e padrões de eficiência hídrica, entre outras condições a serem definidas em regulamentação nos próximos meses.
Em caso de descumprimento das obrigações, a empresa perderá os benefícios e terá de recolher os tributos com multa e juros, além de ser impedida de retornar ao regime por dois anos. Os benefícios previstos pelo Redata terão validade de até cinco anos, alinhando-se ao novo regime de transição tributária definido pela Reforma Tributária.
No Projeto de Lei Orçamentário Anual (PLOA) 2026, o governo reservou R$ 5,2 bilhões para o Redata. A partir de 2027, o programa contará também com os benefícios da Reforma Tributária. Tais estímulos têm potencial para atrair investimentos privados de R$ 2 trilhões ao longo de 10 anos, segundo estimativa do Ministério da Fazenda.
Política brasileira
O Redata faz parte da Política Nacional de Datacenters (PNDC), vinculado a Nova Indústria Brasil (NIB). Com a iniciativa, o governo busca impulsionar o crescimento nacional em áreas estratégicas da Indústria 4.0, tais como computação em nuvem, inteligência artificial, smart factories e Internet das Coisas, ampliando a capacidade brasileira de armazenagem, processamento e gestão de dados.
"Demos hoje um grande passo para o processo de transformação digital da indústria brasileira, previsto na Missão 4 da NIB", afirmou o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Geraldo Alckmin.
"Além de estimular investimentos num setor extremamente estratégico, o programa alavanca o desenvolvimento da economia digital no País nas áreas de produção de chips, softwares, redes de fibra ótica e máquinas, entre outras, gerando mais e melhores empregos em toda cadeia produtiva da economia digital".
A elaboração da MP foi coordenada pela Casa Civil, com participação do MDIC e dos ministérios da Fazenda (MF), da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), de Minas e Energia (MME), das Comunicações (MCom) e da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI), além do Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES).
Cenário atual
Diagnóstico do Ministério da Fazenda aponta elevada dependência nacional em relação a serviços digitais prestados no exterior, atingindo atualmente cerca de 60% das cargas digitais brasileiras.
A situação implica riscos à soberania nacional, limita o desempenho operacional das aplicações digitais e acarreta déficits na balança comercial do setor. O déficit do setor de elétricos e eletrônicos na balança foi de US$ 40 bilhões em 2024; e de US$ 7,1 bilhões no setor de serviços, sendo a maior parte relacionada ao processamento e armazenagem de dados.
A implementação da política leva em conta ainda as vantagens comparativas do Brasil para atração de data centers, como energia renovável a preços competitivos e infraestrutura de comunicações adequada para o tráfego internacional de dados por meio de cabos submarinos em operação.
Apesar desse potencial, o Brasil possui uma participação pequena no mercado mundial de data centers, ocupando a 10ª participação relativa, atrás de países como Japão e Holanda.
Ascenty comemora
Em nota, Marcos Siqueira, CRO e Head de Estratégia da Ascenty, afirmou que medida provisória deve incentivar não apenas os data centers, mas todo o ecossistema brasileiro de infraestrutura. "É um momento decisivo e, se tudo caminhar bem, estaremos no timing perfeito para nos consolidarmos como o hub de data centers da América Latina", comentou.
"O Brasil já tem um cenário com um diferencial raro no mundo: energia limpa e abundante. Essa combinação, com uma mudança na carga tributária, pode atrair projetos bilionários de grandes players globais, que hoje estão decidindo onde instalar estruturas capazes de gerar empregos, movimentar a economia e moldar o futuro digital", prosseguiu Siqueira, que também faz parte do board da TelComp.
Idec critica proposta
Mas a nova medida anunciada pelo governo nesta quarta foi alvo de críticas de setores da sociedade, como o Instituto de Defesa de Consumidores (Idec).
Segundo a organização, a proposta do governo é incongruente, pois nos últimos meses, o Poder Executivo tem levantado a bandeira da soberania nacional como princípio estratégico. Mas, diz o Idec, a proposta do Redata propõe a "entrega" dos recursos naturais brasileiro às grandes corporações do setor de data centers e big techs.
"Esses incentivos vêm sendo utilizados como moeda de troca em negociações econômicas. Enquanto isso, ignora-se a construção de uma política pública estratégica voltada ao interesse coletivo e à proteção da natureza", diz a entidade.
Outra crítica apontada pelo Idec é a ausência de salvaguardas socioambientais e climáticas que previnam impactos constatados em experiências internacionais e nacionais, especialmente as que envolvem os recursos hídricos, o aumento de custos energéticos locais, a poluição, conflitos territoriais e exclusão de comunidades locais, indígenas e tradicionais dos processos decisórios. "Menções às obrigações ambientais são vagas e sem definições claras de termos como 'energia limpa' ou 'eficiência hídrica'", aponta o Idec.
A falta de regras sobre extrativismo mineral, destinação de resíduos eletrônicos e responsabilidade no ciclo de vida de equipamentos como GPUs, baterias e servidores também é outro aspecto apontado pelo Idec.
A entidade afirma que data centers exigem extração intensiva de minérios estratégicos e geram volumes relevantes de resíduos especializados e materiais críticos. "Esses materiais exigem logística reversa, reciclagem e redução de toxinas. Sem regras, o País será mais um repositório de sucata eletrônica".